Até quando?

... o primeiro grande problema é que o PSD precisa de uma OPOSIÇÃO SÉRIA com uma direita coesa e forte mas só encontra alcoviteiras e trailiteiros. Até quando?

terça-feira, 20 de março de 2012

Otelo não viu: a Intersindical substituiu o MFA

O Presidente da República visitou oficialmente Trás-os-Montes.

Durante dois dias, proferiu vários discursos com sentido político e inaugurou estabelecimentos cujo contributo para o repovoamente e reanimação daquela região do interior parece inegável.

Mereceu no noticiário da TVI, como balanço da visita, uma breve referência com especial relevância para as duas manifestações de meia dúzia de contestatários de políticas do governo.

Curiosamente, além daquele pequeno ajuntamento de gente extravagante que parecia protestar contra uma barragem, a TVI deu particular destaque a um grupo que se manifestava contra o Serviço Nacional de Saúde, pois exigia que o Ministro da Saúde não «desviasse» os «clientes» das análises clínicas para os hospitais públicos.

Ao mesmo tempo, a TVI transmitia insistentemente e em directo longos discursos do líder do PS, António José Seguro, em que acusava o Ministro da Saúde de querer desmantelar o Serviço Nacional de Saúde … ?!

Mas, enfim, deixemos isto … é uma questão de coerência editorial!

Enquanto Cavaco Silva mereceu breve referência, a TVI deu a maior atenção a Otelo Saraiva de Carvalho que acha que as forças armadas devem fazer um golpe de estado e derrubar o governo.

Otelo diz que sabe que houve eleições gerais há pouco tempo mas ele também acha que o povo é representado, não por si próprio quando é chamado a eleger, mas pelas forças armadas que, não sendo eleitas, representam em permanência o povo e sabem, em cada momento, o que é que convém ao povo.

Não surpeende esta visão de democracia que o coronel nos mostra com perturbante insistência.

Otelo nasceu e cresceu no Estado Novo, em ambiente em que uma minoria branca se achava com direitos sobre a vida de uma maioria negra – naturalmente, isso influenciou a formação da sua personalidade.

Nasceu colono em Moçambique, talvez a única colónia onde se praticava o racismo puro e duro, tipo «Apartheid».

Veio para Metrópole, como a maioria dos jovens colonizadores, estudar para uma carreira militar e jurar defender a Pátria e o Estado Novo chefiado por Salazar.

O poder estava na Metrópole.

Ainda jovem, infiltrou-se nos círculos para-militares de defesa do regime de Salazar, chegando a instrutor da Legião Portuguesa.

O ambiente político envolvente, na Academis Militar e na Legião Portuguesa, não deixaram de desenvolver e consolidar a formação da sua personalidade.

Era aí que estava o poder!

Fez várias comissões como oficial das Forças Armadas na guerra contra o «terrorismo» nas colónias.

O seu perfil e curriculum levam-no para o Quartel General de Spínola, um general com formação nas Forças Armadas de Hitler, o que lhe granjeou inusitado prestígio militar e político no regime do Estado Novo.

Otelo serve Spínola e o Estado Novo nos serviços «psicossociais», como oficial da «inteligência» e propaganda política.

Era aí que estava o poder.

Por razões que não vêm ao caso, o regime do Estado Novo cai e o poder é tomado imediatamente pelos comunistas ortodoxos do PC, com a ajuda dos outros comunistas, os informais, que desenvolveram intensa actividade no processo de criação de condições políticas e sociais para a consolidação do comunismo em Portugal.

Otelo coloca-se à frente desses comunistas informais, afirma-se social democrata para não dar nas vistas mas, após uma visita de trabalho a Cuba, uma calorosa recepção de Fidel Castro e intensiva doutrinação pelos agentes da propaganda, regressa a Portugal convertido ao comunismo, à chamada acção directa.

É no comunismo que reside agora o poder.

Álvaro Cunhal, o líder histórico comunista, disse isso mesmo no próprio dia em que soube que nunca ganharia eleições em Portugal: os resultados eleitorais não reflectem a natureza do poder – o poder está no MFA, nas forças armadas do povo.

Otelo passa a comandante operacional das milícia, das forças de defesa do comunismo, deixa-se controlar de muito perto por dirigentes comunistas ortodoxos e reforça as suas ligações ao comunismo informal e aparentemente desviante.

Mostra-se um ditador potencial, um coronel útil no arranque de todos os processos de estabilização comunista.

Muitas peripécias se passaram até que o comunismo foi derrotado.

Otelo não conseguiu defender o regime; afastado do poder deixa de ter qualquer interesse para os comunistas ortodoxos e inicia uma carreira de «comunista marginal», ao lado de grupos políticos marginais que, entretanto, se vão desfazendo à medida que a democracia política e civilizada se vai desenvolvendo.

Autoritário, de fala fácil e gesto largo, cultura sem fundamentos, frágil e superficial, intelectualmente dirigível, com vocação de subordinado ao poder protector, irresponsável que desconhece a dimensão humana da Liberdade e praticante de abundantes basófias encomendadas, reuniu as principais qualidades do comunista tipo mas perdeu-se no meio da sua arrogância fantasiosa e acabou limitado a um pequeno círculo de nostálgicos do poder que continuou a bajulá-lo.

Otelo não percebeu que os dirigentes comunistas puseram de parte as forças armadas e substituiram os militares úteis por sindicalistas afoitos, protegidos por leis inóquas, alguns ingénuos também, mas todos com a missão de se constituirem em minoria de poder com condições instabilizar e derrubar as maiorias, a democracia burguesa.

O papel do MFA é atribuido à Intersindical, as espingardas são substituidas por greves e ocupação de praças públicas e Otelo é substituido por Arménio Carlos.

Resta-lhe agora a extravagância de atitudes e um comportamento excêntrico para chamar sobre si as atenções … e os aplausos de meia dúzia de frustrados políticos.

E a única expressão ideológica que reteve, da direita autoritária do Estado Novo e do comunismo ortodoxo parece ser a seguinte: a vontade popular expressa nos resultados de eleições gerais não tem qualquer significado nem relevância pois o que prevalece é sempre a vontade das força armadas.

As eleições gerais são mera formalidade, a cumprir enquanto não for possível extingui-las.

Otelo poderia ter sido um afamado militar do Estado Novo e teve todos os ingredientes do coronel comunista de há quarenta anos; foi oportuno na primeira mudança de regime mas não percebeu a segunda mudança de regime e não quis obedecer ao comunismo ortodoxo, que mandou sobreviver retrocedendo.

Não soube perceber a evolução dos tempos mais recentes, escapou-lhe a passagem forçada do poder comunista para a democracia, não deu conta da substituição dos militares pela Intersindical e pelos indignados, e acabou abandonado por todos.

Não passa de um ditador frustrado, de um comunista frustrado – por isso diz as barbaridades que lhe ouvimos, de vez em quando, quando sonha com o poder.

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