Manuel Alegre escolheu Ponta Delgada, Açores, para formalizar a sua candidatura à Presidência da República.
Boa malha, pensará ele.
Vai reiniciar-se usando, desta feita, o estranho e sinuoso caminho de Antero da Quental e usurpar a herança do fundador de um socialismo pré-republicano sempre fora de moda, poeta e pelejador político anti-monárquico.
E erguerá a voz para trazer à sua candidatura o velhíssimo século de um Eça de Queirós, Guerra Junqueiro ou Ramalho Ortigão.
O PS, e Sócrates em particular, vão ver-se muito atrapalhados nestes tempos de rejeição das literaturas, revoluções de botequim e de fundamentos ideológicos.
Sócrates ainda deve viver os tempos em que o socialismo nasceu com Soares e morreu com Jorge Sampaio – Ir mais atrás será mesmo uma enorme violência para o Cenáculo que criou com Armando Vara, Rui Pedro Soares, Henrique Granadeiro, Manuel Pinho, José Lello, João Marcelino e Leite Pereira e o açoriano Ricardo Rodrigues.
E é por isso que Alegre, sem dúvida, vai fazer «figura».
Ele será, como o outro, o original, o cavaleiro ambulante dos tempos, em busca incessante da efémera fama, qualquer fama, saltitando de albergue em albergue – mas sempre um albergue esquivo que se lhe escapa tão rapidamente quão intensa se alinhava a apologética dos albergantes mecenas, antes de perderem a paciência e o deslumbramento.
Certamente, ninguém lhe nega o direito de se abeirar em alpendres que nunca pisou.
Mas não lhe será muito fácil criar linhas de comparação ou versar espólios literários e políticos comuns.
Esperemos que não encontre rima apenas no descalabro mental das últimas polemizações intelectuais com a vida e no destino final com que Antero de Quental acabou por resolver o seu problema – talvez a decisiva tomada de consciência de uma vida perdida porque vazia, inútil e sem sentido!
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